quarta-feira, 20 de maio de 2015

Primeiro livro de Meruane no Brasil trata da cegueira

Foto de uma mulher olhando para seu reflexo no vidro de uma janela. Quando trabalha, a chilena Lina Meruane se torna uma obcecada. “Um romance é o produto de uma escrita em transe”, conta. Roberto Bolaño, seu conterrâneo, tratava Meruane como escritora endemoninhada. Ela concorda com a definição. Por isso, somente depois de muitas páginas escritas, ela percebeu que “Sangue no Olho” (Cosac Naify) não parecia o livro de memórias imaginado a princípio. “A obra era menos um relato intenso sobre minhas experiências do que um experimento linguístico sobre o efeito da cegueira”, diz Meruane, professora da Universidade de Nova York. NOVA YORK, EUA. “Sangue no Olho”, elogiado por Enrique Vila-Matas, primeiro livro da autora publicado no Brasil, narra como uma escritora chilena radicada em Nova York sucumbe a uma enfermidade misteriosa. De repente, em uma noite de sábado, os seus olhos se encharcam de sangue negro. “Ao contrário de outros autores, como José Saramago, que inventaram um narrador para falar de quem está privado da visão, eu escolhi uma narrativa que se desenvolve de dentro da cegueira”, diz. “Eu escrevo sobre as reações de um personagem àquilo que ele não entende. O que faço tem mais a ver com o como do que com o porquê.” Narrado em primeira pessoa por Lina, “Sangue no Olho” tem teor autobiográfico. Embora desconverse sobre o assunto, a escritora chilena sofreu um problema ocular menos grave que o da personagem do romance. A dedicatória do livro é para Paul Latkany, o oftalmologista que tratou a autora. Leitor de Meruane, Bolaño a associou esteticamente com certa escola francesa (Marguerite Duras, Nathalie Sarraute), em que uma perspectiva mais subjetiva e introspectiva se recusa a abrir mão de qualquer coisa. “Assim como a personagem, eu me sinto perdida nas cidades”, ela admite. “A minha relação não é tão intensa com o espaço. Eu me apego a experiências emocionais.” A autora identifica três forças binárias no livro: dois olhos, dois amores, duas cidades. Antes de se submeter a uma cirurgia em Nova York, a protagonista visita a família em Santiago com Ignacio, o seu namorado espanhol. Quando chega ao Chile, Lina encontra um grupo que lhe ameaça a paz interior, aquele turbulento clã de origem mediterrânea armado de amor até os dentes. “‘Sangue no Olho’ não romantiza, ele retrata o amor sufocante dos familiares”, diz Meruane. Santiago se revela um lugar insalubre para a personagem. Agora Lina só pode ver o que ela lembra. E a sua visão é o passado de um país que não se curou da ditadura de Augusto Pinochet. Ficha O quê. “Sangue no Olho”, de Lina Meruane, ed. Cosac Naify, tradução de Josely Vianna Baptista, 192 páginas, R$ 34,90. Fonte: site do Jornal O Tempo. Primeiro livro de Meruane no Brasil trata da cegueira

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