sexta-feira, 30 de março de 2012

trilhos da saudade!Ralph Mennucci Giesbrecht Passo pela via Dutra ou na rodovia Ayrton Senna e vejo as cidades ao longo da estrada. Ao contrário de outras regiões do Estado, aqui no Vale a maioria das cidades já existia quando a linha do trem chegou, nos anos 70 do século 19. Como no resto de São Paulo, aqui também as ferrovias trouxeram o progresso, com empregos e obras de artes em muitos casos belíssimas. E trouxeram também a opção de o cidadão poder sair de sua terra e em poucas horas chegar a lugares que até então poderiam tomar dias de viagem desconfortável. Durante cerca de cem anos a ferrovia foi a melhor opção de viagem no Brasil. Quem não teve um tio, um avô ou qualquer outro familiar ferroviário? Era um emprego sofrido, mas que dava dignidade e que sustentava inúmeras famílias. Aí, por motivos vários, mas cujos principais fatores foram o aumento do custo da mão de obra de manutenção e a clara opção do governo por um quase monopólio de transporte rodoviário, as ferrovias foram caindo no abandono. Pelo interior afora, diversas delas foram sucateadas, com seus trilhos, imóveis, locomotivas, carros e vagões. E até que no Vale do Paraíba a principal delas continuou por ali, até hoje em operação. É verdade também que algumas linhas foram sendo substituídas por variações mais modernas, com menos curvas e aclives, por motivos econômicos, primordiais para a sua sobrevivência. O Vale do Paraíba tem exemplos de diversos casos. Começou com a Estrada de Ferro Dom Pedro II, vinda do Rio de Janeiro, no início dos anos 70 do século 19. Com diferença de tempo muito pequena, a Estrada de Ferro do Norte, também chamada de E. F. São Paulo-Rio, começou a ser construída vinda de São Paulo para se encontrar com a outra em Cachoeira Paulista. Bitolas diferentes, a primeira, larga (1m60) e a segunda, métrica fizeram com que fosse necessária uma custosa baldeação em Cachoeira. Nos anos 80, a Minas-Rio sairia de Cruzeiro com direção a Três Corações, em Minas, para ser seguida pela E. F. do Bananal, ligando Barra Mansa a Bananal, pela E. F. Resende-Bocaina, que ligava Resende a São José do Barreiro... mais tarde, a Lorena-Piquete, em 1906, e a E. F. Campos do Jordão, em 1912. Todas elas, com exceção das de Campos do Jordão e de São José do Barreiro, esta desativada em 1928, acabaram caindo nas mãos da saudosa Central do Brasil. As linhas que vinham de São Paulo e do Rio de Janeiro acabaram unidas com a mesma bitola larga em 1908 e se tornaram o ramal de São Paulo, a melhor linha da Central. Por mais de cem anos, estações foram sendo construídas e demolidas para dar lugar a outras maiores e mais modernas, prédios que enquanto eram utilizados com regularidade eram muito bonitos, majestosos, mesmo. Com a sua desativação a partir principalmente dos anos 80 do século 20, começou o abandono. Mas, curiosamente, mesmo abandonados e depredados, conservam sua beleza, num paradoxo de difícil compreensão. Pouquíssimas estações do ramal de São Paulo estão ainda tendo alguma utilidade para a atual concessionária da linha, a MRS, como por exemplo a estação de São José dos Campos. Mal cuidada, ela ainda é bonita. Infelizmente, as concessionárias não têm o menor interesse na restauração desses prédios, quase sem utilidade para elas. Esta estação foi aberta em 1925, para substituir a outra que ficava na parte alta da cidade e desativada justamente para que o trem não tivesse mais de subir e descer o Banhado. Fotografias antigas mostram estações em atividade, com a locomotiva a vapor ao lado, o povo nas estações aguardando o embarque... vida, enfim. Hoje, quando olhamos o abandono, o descaso enorme, como em Guaratinguetá, perguntamo-nos por que não cuidamos do que é belo. Estações pequenas, pouco usadas por passageiros quando havia trens para isso, foram as da variante do Parateí. Essa linha foi construída para substituir o trecho entre Poá e São José dos Campos nos anos 50, passando por regiões pouco habitadas. A linha velha, porém, foi utilizada até fins dos anos 80, e a variante somente a partir daí carregou todos os cargueiros entre Rio e São Paulo. O trem de Prata passou por ela nos anos 90, mas nem dava bola para as pequenas e já abandonadas estaçõezinhas. Uma delas ainda está de pé ao lado da via Dutra, perto de onde essa linha cruza a rodovia, ali perto do cruzamento com a Ayrton Senna. Ela se chama Remédios. Alguém sabe seu nome? Alguém se lembra dela? Pois é, ela está ali, depredada... Como depredada está também Limoeiro, na linha velha, ali na área industrial de São José, e muitas outras, perdidas por aí. Cada uma das inúmeras estações do Vale do Paraíba tem uma história na maioria das vezes triste e de esquecimento. São lugares que já tiveram um enorme movimento e que deram uma contribuição significativa para o progresso do País. É realmente uma pena que não se cuide dessas estações, armazéns, casinhas de turma abandonadas ao longo da linha e que somente por milagre não foram derrubadas. As idéias para o reuso de todas elas são inúmeras, mas falta dinheiro e vontade política. Afinal, memória é fundamental na construção do patriotismo, na construção de uma Nação.

Nenhum comentário:

Postar um comentário